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Análise da crise na Europa, o saque de dinheiro na Grécia e Espanha e o reflexos no Brasil, inclusive mercado imobiliário

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Pessoal, os recentes fatos espanhóis e gregos são muito graves. Em complemento ao artigo anterior sobre análise da economia interna e externa de maio de 2012, convém uma abordagem mais específica sobre a crise na Europa e uma avaliação do potencial de influência destes fatos sobre a economia e o mercado imobiliário brasileiros.

O quarto maior banco espanhol, o Bankia, foi nacionalizado. Isto aconteceu, naturalmente, porque havia risco de desequilíbrio contábil, ou seja, risco de quebra. Não há muita informação publicada sobre os motivos da estatização do Bankia, mas é óbvio que foi problema com sua liquidez e sustentabilidade. Não se falou de mera intervenção temporária estatal, o que pode acontecer também no Brasil, na hipótese de um desajuste grave nas contas ou infração a níveis contábeis exigidos de segurança da higidez e liquidez bancária. “Nacionalização” é termo eufemístico que quer dizer estatização. E estatização em sociedades maduras só ocorre por risco de quebra.

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Então senhores, todo o esforço e negociações feitos na Europa até aqui não está impedindo o risco de quebra de bancos europeus. Dezesseis bancos espanhóis acabaram de ser rebaixados pela Moodys. Mesmo com calote grego de 50% de sua dívida acordado e aceito por 97% dos credores, a Grécia não consegue ir mais fundo nas condições acordadas que previam mais austeridade. A França elegeu o candidato que defendia menos austeridade e mais crescimento e emprego. Vários países europeus que apoiavam a austeridade tiveram eleitos os partidos de oposição para a Presidência. A região mais populosa da Alemanha elegeu a oposição em recente sufrágio regional.

Mas o pior de tudo: iniciaram-se movimentos de saques em bancos espanhóis e gregos. Se isso se intensificar, senhores, é o início do caos na Europa. Nenhum banco em nenhum país em todo o mundo pode aguentar saque em massa de dinheiro. Por quê? Porque a atividade bancária pressupõe a multiplicação dos valores depositados. Desde o início da atividade bancária, através de depósito de ouro com ourives na Europa, o cerne da atividade reside em emprestar algumas vezes o valor que historicamente fica depositado sem ser retirado das contas individuais.

A soma dos totais de operações de saques e depósitos sempre deixam uma margem histórica de valores que sempre se encontram à disposição do depositário, ou seja, do banco. Com base nessa estatística o antigo ourives e hoje os bancos, emprestam valores a terceiros contando com a existência e perenidade desses valores excedentes em contas para fechar as operações de empréstimo. Isso é o organograma simples das operações bancárias, lógico. Então senhores, vocês já entenderam, né? Nenhum banco tem todo o dinheiro depositado pelos correntistas, pois emprestaram várias vezes o valor que remanesce da soma das operações de saques e depósitos e precisam destes valores para fechar suas operações diariamente. O que mantém um banco de pé é sua confiabilidade no mercado em que atua, confiança de credores e dos clientes poupadores.

Bem, um banco confiável não é estatizado. Um banco com contas em ordem não é estatizado. Ao menos em países civilizados. Sendo assim, os espanhóis sacam seus valores por medo de quebra do Banco Bankia espanhol, recém estatizado, e os gregos sacam indiscriminadamente com o objetivo de ter euros em casa, no caso de a Grécia sair da Zona do Euro e voltar a ter dracmas no lugar de euro como moeda, o que significaria que todo o dinheiro em euros de poupadores se transformariam em dracmas. Ou seja, as poupanças em euro hoje podem perder até 70% de seu valor no mesmo dia da saída da Grécia da Zona do Euro!!!

Senhores, a situação é gravíssima. Se não resgaterem credibilidade de seus povos e os sistemas financeiros ruírem na Espanha e Grécia, o Euro ficará seriamente abalado. Mas a Grécia também tem essa importância? Sim. Não pela sua economia, mas pelo princípio. Pois o calote grego foi negociado com a perspectiva de pagamento do valor negociado, e com a garantia de manutenção de economia grega em euro. Se isso puder ser quebrado, esses pressopostos podem não mais se aplicar aos países da Zona do Euro que precisem de ajuda financeira. E sem confiança neste projeto financeiro continetal, o EURO, ficará difícil fazer pactos e negócios com base no pressuposto de uma região unificada em torno da moeda comum. Esmaecendo sua imagem e seu poder de calcar políticas de financiamento entre países ou tomada de empréstimos de bancos privados, que passarão a contar com a hipótese de não receber em euros, a confiabilidade da existência e uso da moeda pelos países de economia mais fracas da Zona do Euro, pode gerar uma perda de confiabilidade na moeda com poucas possibilidades de reversão. Isso seria o fim do EURO.

Bem, ainda não acredito no fim do Euro, ainda. A tomada de nova postura pelos novos governos europeus podem salvar o Euro. Como as sociedades não estão conseguindo suportar a política de austerida e seus reflexos em desemprego e falta de crescimento, talvez a adoção de políticas keynesianas, sugeridas inclusive pela Presidente Dilma aos europeus e apoiadas pelo Blog, podem gerar crescimento econômico, diminuição de desemprego e… inflação, claro. Mas a volta e o foco no crescimento econômico pode gerar divisas para todos os países do Euro pagarem suas dívidas públicas.

E como isso se reflete no Brasil? A Europa resolveu tudo de uma forma pior do que nós no Brasil fizemos. Lá não houve responsabilização civil ou criminal dos banqueiros que faliram o sistema financeiro europeu com o uso dos títulos subprime. Agora, com esta situação caótica, as famílias européias estão com menos dinheiro (e muitas sem emprego) e não podem consumir. Assim, China, EUA, o Brasil e todo o mundo não podem mais contar com o mesmo nivel de consumo europeu. O mesmo acontece com os EUA, que não consomem mais da mesma maneira. E China, Brasil e todo o mundo crescerá menos.

Isso tem um lado positivo para o Brasil que é menos pressão inflacionária (que deve ser avaliada com evolução das commodities, safras agrícolas e evolução do câmbio, hoje também deflacionárias, mesmo a evolução autal do câmbio ainda não apresentou potencial inflacionário significativo). Mas isso demanda que ativemos o consumo interno. Esta configuração de fatos nos possibilita descer mais o juros Selic e pressionar mais por baixa de juros bancário. Isto possibilita também a Dilma promover o resgate de dívidas de campanha com os servidores, pois melhorar a remuneraçãode servidores públicos (e respeitar a correção constitucional anual e a autonima dos Poderes da República em gerir seus orçamentos constitucionais), além de resgatar sua dívida com estes setores, gira a economia e estimula uma parte importante do mercado interno. Também é o momento de investir em obras de infra-estrutura, criar obras e serviços públicos e não somente focar na diminuição infinita da relação dívida/pib. Não há necessidade de uma relação dívida/pib inferior a 30%. Estamos em 36% e a meta do governo é fechar 2014 com 30%.

O Banco Central e o Governo têm hoje à disposição muitas possibilidades para estimular o mercado nacional (afrouxamento de depósitos compulsórios, medidas macroprudenciais, contratação de obras públicas e servidores públicos, promoção de desonerações tributárias setoriais, etc..). O governo está, hoje, totalmente a cavaleiro. Mas se não tomar medidas e ficar meramente reativo com o que vier de fora, pode perder algumas oportunidades, mesmo que na situação atual esteja muito difícil perder o rumo. O Brasil terá agora a oportunidade de ouro para diminuir diferença de nivel de vida com os europeus, até porque o nível deles baixará. Baixará, é bom que se diga, porque havia uma insustentabilidade na riqueza européia e americana recente que contava com o subsídio de títulos calcados em valores inexistentes (os títulos sub-prime e instituições financeiras até três vezes mais alavancadas do que as brasieliras). Eles baixarão um pouco o nível e nós podemos aumentar o nosso. Avanço em obras de infra-estrutura, investimento em prestação maciço de serviço público de qualidade e em quantidade para toda a população. Creches públicas, escolas públicas, universidades Públicas, hospitais públicos e funcionários bem pagos em todos os setores públicos garantirão aumento de nível de vida do brasileiro. O momento é esse.

Quanto ao mercado imobiliário, que é um mercado acompanhado pelo Blog, vejo nesse momento uma situação interessante.

Caos econômico eleva dólar, ouro e mercado de bens reais, em especial imóveis. Isto porque em situação de perda de confiança financeira, os investimentos migram para esses bens de investimento e saem de bolsas de valores, títulos de dívida pública de países da alto risco, por exemplo. Agora, vejam, a crise financeira já existe desde 2008. Os fundos trilionários que existem no mundo já se posicionaram de forma defensiva durante esses quatro anos. Não leio mais nenhum movimento brusco de grandes valores. Vocês lembram quando George Soros vendeu toda a sua posição na Petrobrás de uma vez? Pois, é.. não há mais notícias dessas. Não sei se haverá, pois todos já tomaram posições defensivas.

Assim, o mercado brasileiro de imóveis como fuga para o risco de caos econômico e financeiro na Europa não é impossível e geraria uma nova onda de valorização de imóveis aqui, se ocorresse. Mas não acho provável nem possível que isso ocorra por alguns motivos: já houve grande movimentação defensiva nos últimos quatro anos pelos fundos estrangeiros, os valores de imóveis no Brasil estão altos se comparados com imóveis europeus e americanos, e está praticamente impossível levantar dinheiro para investimentos nos EUA e Europa, onde há baixo crescimento ou recessão e alto nível de desemprego histórico. Não vejo, assim, horizonte de pressão externa sobre valores de imóveis brasileiros significativa.

Por outro lado, a queda do PIB brasileiro para este ano é quase inexorável. Dificilmente o PIB ficará acima de 3,5% e por mais que se baixem juros selic ou bancários, a família brasileira continua com endividamento relativamente alto e com contratações de bens de altos valores muito recentes (carros e imóveis), não havendo no prazo de três a cinco anos, horizonte de grandes capacidades de alto consumo, ao meu ver. Baixar juros alivia e estimula o consumo. É o que se pode e se tem que fazer. Não há dúvida. Mas o brasileiro está melhor informado e os bancos estão responsáveis na concessão de empréstimo (graças a Deus) e não vejo grandes pressões internas por compras de imóveis e carros, por exemplo.

Portanto, não vejo alteração para a tendência de ajuste no mercado imobiliário brasileiro, mesmo com a piora da crise na Europa.

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