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O discurso vazio liberal sobre carga tributária

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É comum nas discussões políticas os argumentos conceituais da economia ortodoxa quando os ideólogos reclamam da carga tributária brasileira.

A relevante pergunta é: – “Carga tributária, para quem?”

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Todo economista [“de Mercado”] com acesso livre na TV sempre menciona os 16% atrelados ao PIB sobre as despesas com a Seguridade Social. Boa parte das despesas são determinadas pela Lei Nº 7.689/1989 (CSLL) e pela Lei Complementar Nº 70/1991 (PIS/COFINS), fundamentadas pela previsão da CF/88, art. 195, inciso I, alíneas “b” e “c”. Na leitura da legislação, senhores, aprendemos que a despesa tratada é o retorno para o cidadão brasileiro: na Saúde, na Assistência Social, incluindo programas específicos e na Previdência, aquela para o seu descanso de uma vida laboral.

Os impostos indiretos (IPI, ISS e ICMS) são repassados para os preços de tudo que você consome. O empresariado é apenas mandatário da arrecadação. E a retirada deles, puramente, [é provável que] não garantirá o desconto no preço final dos produtos visto que a própria teoria econômica ortodoxa explica que esses preços se ajustariam [ao longo do tempo] na oferta e demanda, ou seja, se convolaria para o lucro do empresariado. Exigiria muita concorrência [contrária à realidade] e fiscalização na defesa econômica [abstraída na ideologia do estado mínimo] pelos órgãos de controle, portanto, uma fantasia no universo liberal [1].

Também é comum os argumentos sobre a “desoneração da folha de pagamento”, dentre as despesas e contribuições incidentes estão muitos direitos alcançados pelo trabalhador como, por exemplo, o INSS, o FGTS, sua multa rescisória do contrato de trabalho, o adicional da LC 110, RAT, salário família e educação. Outras garantias como auxílio-doença por 15 dias de afastamento, aviso prévio indenizado, contribuição sindical constitucional, o vale transporte, licença maternidade, férias remuneradas com terço constitucional, repouso semanal e 13º salário. Nas categorias específicas, a contribuição ao Sistema S, e/ou a contribuição ao INCRA nas atividades rurais.

Na informação acima, perceba bem quem perderá com tal discurso liberal.

Sobre o fator tributário, o importante salientar é que a organização empresarial prevalece-se da disciplina da “contabilidade de custos” a fim de determinar suas pretensões de retorno do investimento inicial e do lucro (reinvestimento, dividendos). Desta forma, contabilizam-se todos os custos, inclusive a perspectiva de toda a incidência tributária, com o objetivo na determinação do preço. Portanto, quem paga é o consumidor. Sobre o fator trabalhista, afirma-se que o empresariado NÃO vai contratar MAIS somente porque o trabalho ficou mais barato. Se a máxima fosse essa teríamos retornado ao pleno emprego, auferido em 2014, após a reforma trabalhista de 2017 [da precarização], ou com a carteira verde amarela do governo passado [2].

O empresário contrata quando há demanda no mercado, de consumo ou fomento econômico. Algo que não irá se alcançar com as reformas propostas. Somente há esse movimento com a melhoria da renda na sociedade com a criação de emprego. A inobservância desta prioridade apenas acarretará maior precarização dos direitos do trabalhador, maior favorecimento para a concentração de renda no grande capitalista e o permanente aumento da tragédia já observada no Brasil desde 2016, quando foi quebrado o vetor de investimentos para um ciclo econômico (EC 95).

A única vantagem na redução da carga tributária seria exatamente a incidência numa justiça inversa do que está sendo proposta. Infelizmente, uma parte da classe média (grifo na palavra “parte”), aquela qual deveria demonstrar educação qualitativa (perdoe-me a minha retidão, mas, necessária) é completamente ignorante no assunto. Esta alimenta-se dos conceitos midiáticos “mastigados” pelos economistas “de mercado” e liberais. Aliás, é lógico, por seus clientes “investidores” em participações nas indústrias e empresas do varejo, são eles os anunciantes [patrocinadores] na grande mídia. Não é verdade? Ou “diz o que deve ser dito”, ou “é desmonetizado”.

A proposta ideal seria a tributação menor sobre a produção e o consumo (observadas as informações para controle supramencionadas), consequentemente a redução da incidência [dos indiretos] com maior peso na população mais pobre, então, se compensasse pela tributação progressiva sobre a renda, como está prevista da CF/88, no art. 145, §1º, e mais sobre a distribuição dos lucros e dividendos, hoje isenta, não tributada, quando trazida ao patrimônio da chamada (nos livros de história) “burguesia” concentradora da riqueza. Não podemos esquecer que ainda prevalecerá a contabilidade de custos, porém, favorecerá a amplitude de desconto para uma tentativa de concorrência entre os empresários que reduzirem a expectativa de lucro ou retorno mais rápido em busca do mercado. Obviamente, a tributação não deverá ocorrer no reinvestimento da empresa, aquele capital reintroduzido no ciclo econômico.

A TRIBUTAÇÃO DA RENDA DO TRABALHADOR NO TEMPO

Por fim, para PROVAR O DISCURSO VAZIO liberal, na carga tributária que aflige a renda [principalmente] da classe média brasileira, a do eleitor ideólogo, no dia 12 de janeiro de 2021, o SINDIFISCO [Sindicato dos Auditores Fiscais e Servidores da RFB] publicou um estudo sobre a defasagem na correção da TABELA DO IRPF desde 1996 [3].

A planilha elaborada contempla os dados da RFB e convalidados pelo IBGE, pela aplicação do IPCA no ano de referência, subtraindo a correção da tabela, e a configuração do resíduo consolidado no período da série histórica, conforme seguinte:

Em 11/01/2022, Sindifisco Nacional publicou matéria intitulada “Com inflação de 10% em 2021, defasagem da tabela do IR atinge 134,52%“, assinada por Márcia Carvalho, e explica que “a não correção da tabela do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF) pelo índice da inflação, em 2021, apurado Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) a alta de 10,06%, a maior inflação anual acumulada desde 2015, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), faz com que o contribuinte brasileiro pague a cada ano mais Imposto de Renda do que pagava no ano anterior. Sem reajuste desde 2016, a tabela do IRPF possui hoje uma defasagem média de 134,52%” (acumulados desde 1996) [4].

Observações:
1 – Ressalta-se a correção no final de 2002 (17,5%) sugerida pela equipe de transição ao governo de saída pelo eleito, na ocasião, para a compensação dos 8 (oito) anos de defasagem (FHC) que, conforme exigência legal, deveria a publicação da correção ocorrer ainda em 2002, pelo princípio da anterioridade, desta forma, produzir efeitos no exercício seguinte.
2 – Em verde: A correção da tabela foi acima da inflação. Em vermelho: A defasagem acumulada em 24 anos. O trabalho completo pode ser baixado no seguinte “link”: https://www.sindifisconacional.org.br/a-defasagem-na-correcao-da-tabela-do-imposto-de-renda-pessoa-fisica/

Então, faça v­ocê mesmo um paralelo nas tentativas de correção da tabela entre os períodos dos GOVERNOS PROGRESSISTAS e nos GOVERNOS LIBERAIS, portanto, de 1996 a 2002 (liberais), de 2003 a 2015 (progressistas), de 2016 (derrubada dos progressistas) até 2020 (neoliberais).

A CARGA TRIBUTÁRIA BRUTA NO TEMPO

Ainda no comparativo entre as ideologias, noutra análise global desta carga tributária, contudo sem aprofundar sobre a variação pela incidência entre as classes sociais, o gráfico elaborado pelo Observatório de Política Fiscal do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (IBRE/FGV) pela perspectiva desta variação da carga tributária BRUTA no tempo, observe o vetor:

Referência:
Base informativa em https://observatorio-politica-fiscal.ibre.fgv.br/posts/carga-tributaria-no-brasil-1990-2020. Gráfico atualizado em Jul/2021. Os vetores foram desenhados pelo articulista e as informações complementares colhidas das análises da parceria do IPEA/IBGE e do IBPT [em vermelho]. Para a configuração da lisura desta pesquisa, incluímos os valores [em verde] dos dados publicados pelo SISWEB/STN – Secretaria do Tesouro Nacional – Tesouro Transparente.

Observações:
a) Perceba que no artigo do IBRE/FGV trata à distância a informação da STN e resolveu pela comparação doutras análises (RFB), que divulgou carga tributária bruta em 32,52% do PIB no ano de 2019. Já o IBPT (Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário), entidade privada de análises econômicas e fiscais, sempre oferece valores mais altos. No entanto, a maioria dos analistas econômicos observa com cautela a metodologia do STN (nas exclusões), então, há a preferência pelos institutos autônomos, como o IBRE ou IBPT, e, nesta premissa, acusam que os dados oferecidos pelo atual Sistema do Tesouro Nacional objetivam positivamente um resultado menor. Na cenário recente (2019-2020) as informações são julgadas pelos profissionais como “não confiáveis”, portanto, mantivemos as duas análises.

b) As estimativas feitas pelo Tesouro Nacional (STN) são feitas com base no manual de estatísticas do FMI (Fundo Monetário Internacional), sendo o início da série em 2010. O número oficial sobre a carga tributária costuma ser divulgado pela Receita Federal (RFB) no meio do ano. Em 2021, por exemplo, o maior crescimento foi visto na cobrança de impostos do governo federal, que teve crescimento de 1,53 ponto percentual (para 22,48% do PIB). A carga dos governos estaduais aumentou de forma mais modesta, em 0,55 ponto percentual (para 9,09% do PIB). Já a dos governos municipais aumentou em 0,06 (para 2,33% do PIB) [5].

CONCLUSÃO

A conclusão pela visualização dos estudos, nos governos liberais: a ocorrência de ZERO CORREÇÃO no imposto de renda da população (IRPF), a isenção pela distribuição de lucros e dividendos permaneceu no tempo, enquanto a curva é ascendente na carga tributária bruta sobre o PIB e no consumo. O discurso vazio liberal sobre a carga tributária:

– “O povo é quem sofre maior carga tributária“. Essencialmente pagando a cada ano sem a devida correção da tabela de isenção do imposto de renda pessoa física, enquanto que as pessoas jurídicas tem a possibilidade de maior dedução do mesmo imposto baseada na modalidade do “lucro real”, a não tributação da distribuição dos lucros e dividendos para seus acionistas e cotistas. Como consumidores, todos sofrem a carga tributária, contudo, as classes menos favorecidas são mais sensíveis.


NOTAS:

[1] Na matéria intitulada “Se o imposto for reduzido, o preço das coisas não vai cair aqui no Brasil” publicado no UOL ECONOMIA no dia 05/02/2021, o economista José Paulo Kupfer salienta: “É certo que os impostos fazem parte do cálculo dos custos que vai determinar o preço pretendido pelo ofertante. Mas, este só conseguirá praticá-lo se o mercado estiver favorável, com a demanda mais forte do que a oferta. Nesta situação, uma redução de tributos resultará em aumento da margem de comercialização. O preço final não terá redução – ou mesmo apresentará aumento -, e o vendedor ganhará ainda mais com a redução de custos representado pelo corte no imposto“. A matéria pode ser acessada em https://economia.uol.com.br/colunas/jose-paulo-kupfer/2021/02/05/se-o-imposto-for-reduzido-o-preco-das-coisas-nao-vai-cair-aqui-no-brasil.htm.

[2] Na matéria intitulada “Custo do trabalho despenca, mas emprego não aparece” publicado no MONITOR MERCANTIL, matéria assinada por Marcos de Oliveira, em 14/12/2021, reproduz os tuítes do professor de Economia da UNICAMP, Márcio Pochmann, que explica sobre o custo do trabalho nos menores níveis dos últimos anos e o atual fomento da demanda pós-pandemia não aqueceu o mercado de trabalho justamente pela quebra do ciclo econômico. A dependência dos demais fatores como explicado no texto seria a peça fundamental para renovação do ciclo, certamente com investimento estatal por transferência de renda. A matéria pode ser lida em https://monitormercantil.com.br/custo-do-trabalho-despenca-mas-emprego-nao-aparece/.

[3] Na matéria intitulada “Congelada há 7 anos, tabela do IR acumula defasagem de 130% desde 1996“, publicada na CNN Brasil Business, matéria assinada por Juliana Elias, em 06/01/2022, explica quando não são corrigidas, faixas de cobrança ficam desatualizadas em relação à inflação e salários e levam mais pessoas a perder isenção ou a pagar imposto de renda maior. A matéria pode ser lida em https://www.cnnbrasil.com.br/business/congelada-ha-7-anos-tabela-do-ir-acumula-defasagem-de-130-desde-1996/.

[4] O Sindifisco Nacional publicou matéria intitulada “Com inflação de 10% em 2021, defasagem da tabela do IR atinge 134,52%“, assinada por Márcia Carvalho em 11/01/2022. A matéria pode ser acessada em https://www.sindifisconacional.org.br/com-inflacao-de-10-em-2021-defasagem-da-tabela-do-ir-atinge-13452/.

[5] O jornal Folha de S.Paulo publicou matéria intitulada “Carga tributária é a maior em 12 anos, apesar de promessa de Bolsonaro“, assinada por Fábio Pupo em 04/04/2022. A matéria pode ser acessada em https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2022/04/carga-tributaria-e-a-maior-em-12-anos-apesar-de-promessa-de-bolsonaro.shtml.

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