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A importância empírica e cíclica da direita e esquerda e a vantagem da teoria conformacional

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Importante notar que grande parte do mundo está preso à discussão arcaica sobre se os governos devem ser de esquerda ou de direita. Essa discussão se instalou nos termos em que vemos hoje, com fundo republicano ou parlamentarista, válido para os Estados Modernos com tripartição de funções do Estado (Legislativo, Executivo e Judiciário), desde 1848, quando Marx e Engels assinaram o Manifesto Comunista.

Sim, àquela época ainda existiam impérios, e talvez a data mais precisa para a certidão de nascimento das discussões sobre esquerda e direita como vemos hoje seja 1917, com a revolução bolchevique russa e quando praticamente toda a configuração dos Estados Ocidentais já eram a que se encontra hoje: uma plêiade de Repúblicas e raras Monarquias, estas últimas todas devidamente limitadas por Constituições próprias e assegurado um governo interno (e externo também, apesar de exercido na figura da realeza) eleito pelo povo e exercido consoante seu juízo e acompanhamento.

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Quero remeter-lhe a estes tempos para você ver a incongruência de se manter esse tipo de discussão nessas bases. Hoje, ainda discutimos essas questões de esquerda e direita quase no mesmo nível que existia àquela época. É ridículo. É claro que tive de limitar a referência ao embate esquerda versus direita a no máximo 1848 e, melhor, 1917, pois a configuração do sistema político e a realidade social, econômica e política antes disso e antes de 1789, era muito diferente do que a das sociedades e Estados de hoje. Não dá para, consoante o escopo deste artigo, fazer remissão à origem do embate esquerda versus direita da Idade Moderna, quando a esquerda representava a classe nobre (de cabelos compridos) e a direita os burgueses (cabelos curtos). Essa realidade não se apresenta mais. Os burgueses venceram (ainda bem). E a discussão direita versus esquerda de agora é a instituída a partir da criativa visão de Marx sobre o conflito de classes: capitalistas x operários, e com a terminologia emprestada da época dos impérios ainda, em que a direita era a burgeusia e sentavam à esquerda do Rei, os nobres.. interessante que hoje a esquerda seja a representação dos mais pobres.. (*. ver p.s. abaixo)

Só esta conclusão já demonstra para você como a discussão é meio ridícula.. esquerda x direita? capitalistas x trabalhadores?!?! Capitalistas versus operários? Observem, é válida qualquer discussão que tenha como ponto de partida a questão de defesa de uma perspectiva pró-empresa ou pró-trabalhador, mas não adianta continuarmos repetindo a discussão Marx e Adam Smith. O primeiro é de 1848 e o segundo de 1760!!! Como macro premissas é possível admitir ambos como referências, mas não como realidades, pois as realidades que esses gênios discutiram e suas conclusões datam de suas épocas há entre 170 e 250 anos atrás.

Adam Smith afirmava que o Estado não aumentava a riqueza das nações, pois sua prestação de serviço, por exemplo de segurança, não podia bancar a prestação de serviço de segurança do ano seguinte, por exemplo. Segundo sua ótica, nas palavras de P. J. O’Rourke, em sua excelente obra “A riqueza das Nações de Adam Smith – Uma Biografia”, da coleção “Livros que mudaram o mundo” da sempre excelente Zahar (Jorge Zahar Editor), um cidadão que produzisse uma agulha produziria mais para o incremento da economia do que o Estado. Mas O’Rourke sublinha que ao falar assim Smith fazia distinção entre efeitos econômicos da produção de bens e de serviços. Smith não conheceu o Banco do Brasil, a Petrobrás, o BNDES. Ele via que onde o Estado estava havia roubo e corrupção e não se criava nada, só se espoliava o cidadão e a economia em proveito próprio dos políticos (falando de Inglaterra, veja.. e de 1760). Por isso queria o Estado longe de qualquer coisa. Com razão, à sua época. Não vamos comentar as frases que ele disse criticando o abuso de empresários em criticarem aumento de salários (contra o quê Smith nada tinha) e não terem pudor em extorquir lucros máximos em prejuízo à melhor dinâmica da evolução econômica de um País. Fiquemos com o básico.

Compreensível também que cem anos após a aplicação da teoria liberal de economia de Adam, Marx, na Alemanha ainda não unificada de 1848, se insurgisse contra as condições de vida do cidadão, cidadã e crianças que trabalhavam 16 horas por dia em troca de prato de comida e cama, enquanto os detentores dos meios de produção e, portanto, dos empregos, viviam de forma nababesca. Qualquer um apoiaria e entenderia a revolta de Karl Marx e Frederich Engels, vivendo em sua época, e entenderiam que deter os meios de produção para “compartilhar” a “mais valia” entre o detentor dos meios de produção e os cidadãos trabalhadores fosse uma hipótese de se sair daquela condição e dinâmica sub-humana de exploração do indivíduo pelo indivíduo. Não vamos comentar aqui as frases obtusas de Marx sobre a inferioridade de alguns povos, as afirmações da vantagem do domínio de uns povos sobre outros para que se alastrasse o desenvolvimento, como acontecia no caso de Texas e Califórnia tomado pelos americanos dos mexicanos, e a dominação de povos da África por europeus… ele era da época da expansão imperialista.. pelo amor de Deus.. (ver frases pinçadas a dedo para deslegitimar a figura de Marx efetuada por Rodrigo Constantino no artigo intitulado “Imperialistas arianos e racistas”, publicado no Jornal O Globo de 18/03/2014, pg. 15)

Então vejam, Adam em 1760 e Karl em 1848, estavam certos em suas épocas. Querer trazer isso pra hoje é que é falta de imaginação e burrice da nossa inteligenzzia (ou falta de).

Como não se discute as questões de hoje com argumentos de hoje, fica-se no eterno embate entre direita e esquerda de forma obtusa e arcaica. E nesse sentido é importante notar, enquanto presos a esta estapafúrdia conversa, a importância empírica do revezamento de governos de direita e esquerda. Porque a esquerda, hoje, é responsável por medidas de diminuição de desigualdade social, ampliação de renda e salário mínimo e expansão de serviços públicos. Enquanto que a direita, hoje, é representada pelas bandeiras de menos impostos, austeridade fiscal, controle inflacionário, diminuição do Estado e contenção de custos de empresas como salário mínimo e impostos, taxas e contribuições.

Então senhores, nessa prisão conceitual, temos de explicitar que o projeto de governo deve ser definido por você no voto. A culpa da situação ser assim ou assada não é dos partidos de direita ou esquerda, mas do que você quis que ficasse no poder por determinado tempo e enfatizando na prática uma política daquelas bandeiras.

Veja, no Brasil, o salário mínimo está de bom tamanho para você? Enquanto você mantiver a esquerda no poder ele subirá. Se você puser a direita, provavelmente ele não subirá mais. Os serviços públicos estão bons para você? Você quer serviços públicos ou prestados por empresas terceirizadas? Veja, enquanto você mantiver a esquerda no poder os serviços públicos expandirão e será muito provavelmente prestado diretamente pelo Estado, sendo que no Brasil a área privada também presta de forma complementar serviços que deveriam ser prestados pelo Estado, como saúde, educação e seguro social (previdência), por exemplo.

Então veja, a existência de ambas as matizes ideológicas será tão boa quanto você consiga implementar o revezamento deles, em momentos apropriados, no poder. Enquanto o salario mínimo não for ideal, os serviços públicos básicos prestados pelo Estado não forem expandidos o suficiente a todos os cidadãos, convém manter a esquerda, desde que não esteja criando uma situação de insustentabilidade fiscal e financeira, claro. Para verificar se se a expansão de serviços e aumento de salário mínimo está criando empecilhos à evolução positiva econômica do Estado e da sociedade é só ver o índice de investimento e lucratividade das empresas na economia, crescimento econômico, criação de empregos, bem como se a dívida pública cresce ou decresce.

Agora, se o salário mínimo está de bom tamanho, se os serviços públicos estão bons, não há problema nenhum em verificar cortes em impostos (pois não prejudicará a universalização de serviços públicos que já estariam entregues à sociedade), controle mais austero da inflação e exigência de inflação zero (rsrsrs), mesmo que a taxas mais altas de juros, porque estamos falando em políticas de manutenção do status quo. Se o status quo é bom, claro que não há problema em mantê-lo.

Mas e aí? Segundo estas perspectivas acima o Governo do PT é, por exemplo, de direita ou de esquerda? É de esquerda. Só que diminuiu impostos, em especial ano de 2013, mantém controle da inflação, crescimento econômico, relação dívida/pib declinante, lucratividade de empresas, com alta taxa de crescimento de investimento em 2013 (6,3%) e uma das maiores taxas de investimento direto estrangeiro da história (50 bilhões de dólares em 2013, a quinta maior taxa do mundo)… E se o PSDB entrasse? Necessariamente os serviços públicos teriam de diminuir, serem piores, o salário mínimo não crescer? Não. Mas uma dinâmica de direita pára (deixei o acento pois faz diferença no sentido) avanços sociais diretos, admite-os indiretos e consequentes da evolução do capital e altera políticas de governo. Mas ele teria tendência em baixar inflação, ao custo social de crescimento econômico e de perda de empregos que fosse etc.. e diminuir custos de empresas (menos impostos – e dinheiro pro Estado prestar serviços-, menos aumento de salários mínimos, menos obrigatoriedade de compras de produtos nacionais quando a Petrobrás ou empresas ganhadoras de licitação ganhassem o direito de explorar bens e serviços públicos) e tentaria sanear despesas públicas ao máximo (menos revisões da tabela de imposto de renda, menos reajustes anuais de salário de servidores públicos, menos investimento em carreiras públicas de médicos e professores, por exemplo e, óbvio, nem imaginar ganhos reais sobre a inflação para servidores públicos, independente do crescimento econômico). Não há problema nesse revezamento, observa? Tudo depende do que você pretende em dado momento e por quanto tempo, para atingir metas econômicas e sociais que você ache interessantes.

Mas a discussão seria muito mais honesta e menos ingênua se se dessem sobre bases da teoria conformacional. Esta teoria, já publicada em livro pelo Blogger do Blog Perspectiva Crítica (“O Estado Conformacional – limites para os atos privados”, Access Editora, 2013), explicita que o Estado é plástico e pode expandir sua presença em sociedade e diminui-la, dependendo da necessidade desta sociedade em dado momento histórico, consoante seus valores sociais e as determinações da vontade social insculpidas na Constituição de cada país.

Aí, não discutiríamos, como fui obrigado a fazer, se é melhor governo de esquerda ou de direita. Aí não precisaríamos do revezamento de “duas visões”, ambas míopes, de Estado. Isto porque hoje já é certo que algumas coisas são metas constantes para sociedades modernas, quais sejam, taxa de desemprego baixa, taxa de crescimento econômico alta, relação dívida/pib declinante, controlada e o mais baixa possível, taxa de inflação mais baixa possível, menor déficit comercial internacional possível, assim como menor déficit fiscal possível  e.. aí a divergência é um pouco maior (não para mim).. prestação de serviços públicos básicos os mais abrangentes possíveis, universalizados, com quantidade suficiente de funcionários de acordo com a demanda do país e da sociedade, com bons salário e bons planos de carreira.

Observe que esses elementos de controle fiscal e econômico, essas metas não podem mais ser tidas como de esquerda ou de direita. Todos devem buscar isso. E a questão é como se chegar à melhor configuração de gastos/investimentos sociais, públicos, privados, para se chegar a estas  metas!! Daí que o debate não deveria ser sobre direita e esquerda, se menos ou mais Estado, mas como ter uma conformação de investimentos e despesas públicas que eliminem atrasos e deficiências do Estado o mais rápido possível, com foco na manutenção de crescimento econômico, aumento de lucratividade de empresas, aumento de salários de trabalhadores, aumento de qualidade de vida das famílias para termos o melhor país e qualidade de vida possíveis no menor espaço de tempo, com sustentabilidade econômica, financeira e fiscal.

Ao invés de ficarmos revezando “esquerda” e “direita” no poder, melhorando nossa vida de forma mais empírica e de tentativa e erro de visões políticas ultrapassadas, seria muito melhor debatermos sem as tintas de esquerda e direita, os gargalos institucionais, econômicos, jurídicos e sociais para termos os melhores salários, na área pública e privada, serviços públicos mais eficientes e sustentabilidade de crescimento econômico e de orçamento público. O correto seria uma discussão sem paixões partidarescas, mas sobre projeto de Nação, sobre premissas mais objetivas e transparentes. O correto seria uma discussão do que fazer sob uma perspectiva conformacional de Estado.

p.s.: Terceiro parágrafo do texto foi corrigido, pois dizia que a direita eram os nobres e a esquerda, os burgueses. Foi o contrário. Houve outras correções e ampliações. Também a nomenclatura direita e esquerda pode ser remetida à Revolução Francesa, quando ao insttuir a Assembléia após o fim da monarquia, os girondinos (representates da burguesia rica) sentavam do lado direito do parlamento e os jacobinos (representantes da pequena burguesia e de linha política mais popular) sentavam à esquerda do Parlamento.

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