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Populismo contra Clubes do Rio de Janeiro: a questão do uniforme de babás sob a perspectiva constitucional

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O Jornal O Globo de 08/01/2013, na página 16, informa que Cabral sancionou projeto de lei que proíbe a exigência de uniformes para babás no Rio de Janeiro. Caso polêmico, parece-me inconstitucional a lei.

Eu frequento o Clube Paissandu. A celeuma sobre a exigência de uniforme, apresentado pela babá à época como discriminatório e por sua empregadora, ganhou essa repercussão desta mesma maneira pelo Jornal O Globo, entretanto a questão era muito mais simples e honesta.

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A exigência, à época, ocorreu por uma questão básica: as regras sociais, calcadas no estatuto social, do clube determinam o uso de uniformes por babás. É uma regra privada de uma associação civil. E qual seu fundamento? Preconceito? Exposição da babá? Perseguição contra a classe de babás? Intento doloso em humilhar as babás?!?! Não. O enfoque é eminentemente prático e no interesse dos sócios e seus filhos. Como?

Já ocorreu de, em meio a acidente de criança no parquinho, não se conseguir se identificar a respectiva babá. Além de que a babá uniformizada não paga convite para entrar no clube e tem acesso livre a ambientes de sócio ao acompanhar o filho do sócio. O convidado do sócio, empregado ou não do sócio, deve pagar convite para entrar no clube e precisa de sua companhia para entrar em determinados ambientes exclusivos aos sócios. Então seria simples a solução da empregadora e sua babá que não quisesse usar uniforme: pagar convite e limitar o acesso da babá em ambientes exclusivos de sócio. É um dilema, pois a babá caracterizada como tal não paga convite. Isso é que gerou a celeuma à época.

Agora, esse dilema, senhores e senhoras, não pode ser resolvido pelo Governador ou pela a Alerj, ao meu ver. Sinceramente. Esse dilema é interna corporis da associação civil e por ela deve ser resolvido com liberdade e respeito às leis. Eu trabalho de terno, mas não sou obrigado. Mas há recomendação recente da Diretoria do Foro de que assessores de Gabinete, em especial no Tribunal, usem terno. É preconceituoso? É indevido?

Observem, a indumentária exigida em locais é um problema local, institucional e estatutário, desde que não fira a lei e direitos individuais. O preconceito quanto a uso de uniforme de babás, me parece, quiçá, um preconceito às avessas em que as babás podem não querer ser identificadas como tal. E por quê? Hoje é um trabalho bem assalariado, em relação a outros empregos. Na Zona Sul podem vir a ganhar até R$2 mil reais e até mais.

Eu entendo que a empregadora, por princípio de defesa da babá, ou por achar-se suprimida no seu direito de regular livremente sua relação com sua babá, ou por achar-se obrigada a comprar uniforme, se rebele contra regra social do clube que frequenta. Mas a regra do clube não existe para escárnio da babá. As pessoas não ficam apontando para a babá de uniforme e rindo como se fosse uma palhaça andando pelo clube.

Por que a babá se sentiria diminuída? Sim, ela será reconhecida como babá, mas esse não é seu trabalho? E isso não é melhor para o controle do acesso ao clube e para encontrar a babá da criança em casos de urgência, o que beneficia o filho do sócio? Então? A regra não é para que a babá se vista de “bozolina”, mas de uniforme branco. Isso é preconceituoso?

No calor do Rio de Janeiro, entrar em Tribunais não é possível de bermuda. Bermuda também não é traje admitido em igrejas e em algumas outras igrejas a mulher não pode entrar de calça jeans. O que fará o Governador, a Alerj e a mídia? Condenarão essas “irrazoabilidades” e determinarão contra as regras privadas destas instituições a liberdade no uso de bermudas e de calça jeans? Em alguns colégios é proibido o aluno usar brinco. O governador vai se insurgir e “resolver” esse problema e infração à liberdade de expressão do aluno que quer usar brinco e que tem apoio do pai para usar brinco?

Já houve a discussão sobre se algumas igrejas não aceitarem homossexuais em seus cultos seria discriminatório. Será? Veja, se a interpretação religiosa de alguns sobre a Bíblia é de que casamento só pode ocorrer entre homem e mulher e sexo só deve ser realizado após o casamento, como ter em seu meio alguém que acredita em algo diferente disso e pratica o contrário? Por que essa pessoa quer frequentar justamente esta Igreja se há outras que aceitam e convivem tranquilamente com homossexuais e com pessoas que fazem sexo antes do casamento? Será o Governador que resolverá isso?

Não estou enaltecendo nada nem regra nenhuma limitadora de grupos sociais. Mas convém perquirir qual o limite da regulação pública em suplantar a regra privada nestas hipóteses, pois o abuso regulatório do governo e da Alerj pode amanhã atacar qualquer instituição, “a bem do moral e da lei”. E isso é o princípio totalitário.

Quem não gosta das regras de uma instituição ou estabelecimento tem dois meios: tenta alterar a regra com atuação interna corporis, falando com sócios e frequentadores da instituição/associação para que a regra atual mude por consenso, ou se desliga da instituição/associação e procura outra com a qual mais se compatibilize.

A regra de impedir que babás sejam identificadas por uniforme, apesar de estar sendo tratada como a segunda lei áurea (ridículo), é uma indevida intromissão pública em associações e instituições privadas que gera precedente grave, ao meu ver, sobre os limites que o Estado deve ter no respeito a regras privadas de instituições e associações civis.

Em breve, teremos o fim das festas black-tie (que não são comuns nem populares), porque, afinal, e se o convidado à festa não quiser usar black tie? Deve ele ser discriminado? E se eu quiser ir a um casamento de bermudas? Parece que alguns artistas gostam de ir de chinelo. Quem deve regulamentar isso? O governador?

Achamos equivocada a abordagem da mídia sobre a questão e populista a medida que impede clubes de exigirem uniformes para babás. Não vemos preconceito dos sócios em relação às babás, mas regras de convívio que focam no bem estar dos sócios e seus filhos e até no da própria babá, já que não precisa ser interrogada ao entrar no clube sobre o pagamento de convites e nem em qualquer outro ambiente de uso exclusivo de sócio, pois identificada como babá sua entrada com os filhos dos sócios é livre, ao contrário até de convidados, que devem estar sendo acompanhados dos sócios.

Mas pior de tudo, vemos um grave precedente, pois a lei sancionada pelo Governador mutilou o processo de discussão interna dos clubes e cerceou a liberdade destes em livremente se regerem de acordo com determinações dos sócios. Isso pode ser estendido para qualquer instituição e associação civil, sempre com o argumento de legitimidade de defesa de minorias ou do bem, do moral, do justo e da lei. Isso é totalitarismo.

P.s.: texto revisto e ampliado.

p.s.2: O Projeto de Lei Estadual 1909/2013 tem três artigos e é explícito em aplicar-se somente a clubes recreativos e similares. Esta especificidade de sujeitos submetidos à regra também descaracteriza a abstração que as leis devem ter, mais uma vez evidenciando sua inconstitucionalidade. Mas o pior é o cerceamento da liberdade regulatória interna de entidades associativas civis.
Veja o texto do projeto de lei sancionado conforme transcrição abaixo:


PROJETO DE LEI1909/2013

EMENTA:

PROIBE A EXIGÊNCIA DE UNIFORME PARA ACOMPANHANTES DE FREQUENTADORES DOS CLUBES RECREATIVOS NO ÂMBITO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

Autor(es): Deputado LUIZ PAULO, GILBERTO PALMARES

A ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

RESOLVE:

Art. 1º – Fica proibido aos clubes recreativos e similares a exigência de uniforme para ingresso em suas dependências de acompanhantes de menores e acompanhantes de idosos e de convidados de sócios da referida agremiação.

Art. 2º – O não cumprimento da presente Lei implicará em multa de 1000 (mil) UFIRs.

Art. 3º- Esta Lei entrará em vigor na data de sua publicação.

Plenário Barbosa Lima Sobrinho , 05 de fevereiro de 2013
Deputado LUIZ PAULO
Deputado GILBERTO PALMARES

p.s.3: A sanção do projeto de lei acima violou os incisos XVII, XVIII, XI e XX, todos do artigo 5º da Constituição da República, em especial o inciso XVIII, o qual determina que “a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas independem de autorização, sendo vedada a interferência do Estado em seu funcionamento.”

p.s. de 15/01/2014 – texto revisto.

p.s. de 22/05/2015 – Texto revisto.

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