Pessoal,
é difícil para nós brasileiros entendermos os programas políticos dos partidos, porque a maioria é legenda de aluguel, e os maiores fazem qualquer coisa para estar no poder (na verdade a história do País e a configuração de poder regional e de partidos leva a isso).
Mas, tirando o PMDB que tem programa simples e prático (estar no Poder), ainda é possível verificar dois programas reais e viáveis políticos: o do PSBD e o do PT.
O do PSDB, senhores, ao meu ver, é o do Estado Mínimo. Isso significa menos funcionários públicos, menor remuneração e investimento em serviços públicos executados diretamente pela Administração Pública.
O pressuposto autorizativo desta compreensão é o de que o Estado e sua Administração são ineficientes por natureza. Não acreditam em metas, fiscalização de serviços públicos e, muito principalmente, não estão dispostos a gastar o dinheiro público com isto. Segundo esta corrente, quanto menos dinheiro público puder ser arrecadado melhor, pois menos dinheiro público existirá para ser roubado pelos políticos e governantes.
Assim, a solução para um Brasil melhor seria diminuir ao máximo os impostos, diminuir os servidores públicos ao mínimo possível, acabar com as garantias de servidores públicos, privatizar e terceirizar todos os serviços públicos possíveis, pois a área privada seria mais eficiente (já que os empregados terceirizados teriam medo da demissão) e menos custosa aos cofres públicos. Por isso, pelo que soube, grande parte do serviço médico paulista é prestado por terceirizados ou cooperativados e as multas de trânsito são distribuídas por uma terceirizada. Sim, particulares autuando multas de trânsito. Parece que há algo em curso semelhante para a educação, ou embrionária ou efetivada na educação paulista.
Além disso, essa corrente político-filosófico-partidária também não acredita em investimento nas Forças Armadas (outra despesa desnecessária), já que não deveríamos rivalizar com as potências hoje dominantes. Por isso Fernando Henrique, inclusive, já disse que deveríamos seguir o que fazem a Austrália e o Canadá, ou seja, sermos tutelados pelos EUA em termos de defesa nacional.
Da mesma forma, assim como todo o funcionalismo público, o sistema de educação deveria ser privatizado, como FHC tentou ao instituir a Prova do MEC. Inicialmente ela aferiria o baixo nível das Universidades Públicas, que se fosse constatado, daria o argumento definitivo para a privatização. Mas não foi o que ocorreu, pois as notas médias das universidades públicas ficaram superiores às das universidades privadas.
Essa filosofia é americanófila. Não em sentido pejorativo, gente, mas por princípio. Esses senhores entendem que o modelo a ser seguido é o norte-americano. O problema é que a imagem de grande nação americana é um mito (Ex.: quem vai a hospital público tem que pagar uma conta altíssima e por isso a reforma da saúde feita por Obama, pois existiam 40 milhões de americanos sem acesso aos sitema de saúde público e sem planos de saúde; licença maternidade nos EUA é de três meses e sem salário; universidade é só pra rico, mesmo com ínfimas bolsas públicas). E o sistema americano político e educacional é elitista e não se aplica a nós. Assim como é uma ingenuidade achar que o tratamento de defesa nacional que os EUA dá ao Canadá e Austrália (de origens coloniais inglesas e integrantes da Comunidade Britânica de Nações) dará ao Brasil. Além disso, a economia americana é 7,5 vezes maior que a nossa, por isso pouco imposto gera muita arrecadação e achar emprego, mesmo sem diploma, é fácil aos mais pobres americanos (hoje com a crise não é tão fácil assim…).
Nós somos diferentes e por isso precisamos de algo diferente.
Somente com esse quadro eu já digo: fica difícil votar num projeto desses para o Brasil.
Primeiro, quem tem uma extensão territorial e rica como a nossa, cercado por 11 vizinhos, não pode deixar de ter política externa autônoma e investimento em Forças Armadas, sob pena de em breve ser subjulgado politicamente e ter que ceder riquezas e às vezes até território. Missões políticas estrangeiras ocorrem todos os dias espalhadas pelos povos indígenas da Amazônia brasileira (ver o livro Relações Perigosas Brasil-EUA – De Color a Lula – autor Moniz Bandeira) e de nossos vizinhos e nos fóruns mundiais o argumento de defesa do meio-ambiente é a isca para que, se não mostrarmos poder de administração e autonomia militar, possam “ajudar a administrar” nossos territórios virgens e por um acaso ricos (ver livro esgotado “A Trilateral”, com uma maçã mordida representando o mundo dividido pelas nações ricas).
Segundo, temos poucos funcionários públicos por habitante (1 servidor/32 habitantes) em relação aos países europeus (França – 1/12,5, Alemanha – 1/18, Irlanda – 1/13), inclusive em relação à Inglaterra (1/29) e aos EUA (1/22 ou 1/25). E funcionário público presta serviço público. O serviço público atinge aos ricos e aos pobres, ou seja, beneficia ambos, mas é mais essencial aos pobres, que não têm tanto dinheiro para obter segurança, previdência, saúde e educação que os ricos e a classe média podem obter pagando. Por isso, serviço público é essencial a nós, brasileiros (também são tratados como essenciais pelos países mais desenvolvidos como França, Alemanha, Suécia, Noruega, Dinamarca e Inglaterra). E pergunto: se os países europeus têm em média duas vezes mais funcionários públicos por habitante (ver artigo do JOrnal O Globo, de 08/06/2010, pg. 21) do que o Brasil, sendo que têm menos pobres e têm economias menores (nós somos a 8ª economia mundial e há 30 países europeus), por que temos de dar menos atenção à nossa cidadania? Por que nossos cidadãos merecem menos atenção do Estado? O momento, senhores, é de investir nos serviços públicos e re-estruturá-los e não o contrário.
Ainda temos de dizer que privatização e terceirização de serviços públicos não é ruim, desde que não de empresas e serviços essenciais. Veja: por que é melhor médico público à cooperativa médica? Se o médico público errar, ele coloca em risco sua própria carreira pública e é fácil de ser encontrado, pois pertence a um quadro público de determinado estabelecimento público de saúde. Se o médico cooperativado errar, ele pode ser demitido e substituído, se ainda estiver em tal emprego. A empresa cooperativa continua ganhando a verba pública e você acha que foi atendido com a demissão, mas outro médico mal remunerado e pouco motivado entrará em seu lugar e nada mudou para você. O comprometimento do funcionário público, selecionado por concurso público, que desenvolve serviço essencial é maior, mas ele deve ser fiscalizado e cobrado. Além disso, o médico público ainda tem uma imagem a zelar, já que por integrar grandes centros médicos de massa e ser mais visado do que médicos particulares cooperativados, termina mais esxposto à sociedade e a sua fiscalização.
O mesmo acontece com multa de trânsito, por exemplo. Um guarda municipal quer multar quem ofende o trânsito. Ele se preocupa com a ofensa ao trânsito, assim como sua estabilidade em cargo público o capacita a somente curvar-se à persecução do interesse público no exercício de sua função. O particular que multa muitas vezes pode ter metas, já pensou? E se não atinge a meta? Seu emprego está em risco? Bem, ele é isento para lavrar multas de trânsito? Em São Paulo, como vimos, há prestação terceirizada de aplicação de multas de trânsito.
E o procedimento fiscal? Terceirizar? Saiba que já estão terceirizando a cobrança. Mas qual a isenção da averiguação da falta tributária que um particular pode oferecer?
Terceirização e privatização são instrumentos modernos de administração pública, mas tem que ser com responsabilidade e não pode ser tratado como panacéia ou única solução para perseguir qualidade do serviço público. É um caminho curto, mas atalhos e simplificações na vida muitas vezes dão dor de cabeça depois.
FHC parece que estava em reunião, antes do dia final de eleição, com estrangeiros versando sobre possibilidade de privatização do Banco do Brasil e Petrobrás, segundo soube. Achei que era mentira porque seria um tiro no pé do Serra, mas a amiga de uma amiga ligou para o hotel e confirmou que a reunião teria ocorrido. E a política de financiamento agrário? O Citibank (estatizado pelo Governo americano, aliás) vai emprestar para os nossos agricultores? E a política de ressurgimento da nossa indústria naval? A encomenda de plataformas e navios brasileiros virá da Shell ou Exxon?
E educação, pessoal, não é para preparar para o mercado de trabalho, exclusivamente. Educação é para formar seres humanos. E isso deve ser garantido a todos os cidadãos, ricos ou pobres, que queiram se desenvolver até esse grau. Por isso deve haver oferta de vagas públicas e ser ampliada essa oferta. Agora, formar cidadão tem custo e é de interesse de toda a sociedade.
Por fim, tributo na Suécia é altíssimo (65% de imposto de renda). Na Noruega e Finlância também. No Japão o imposto de renda é de 55%. E eles não reclamam de imposto (p.s.: Nos EUA, o imposto sobre herança é de 3% a 77% e aqui é de 4%). É porque têm serviço público e com mais que o dobro de servidores por habitante do que nós brasileiros. Portanto, hoje vejo que nosso problema não é imposto, mas qualidade e quantidade de serviço público. Vamos investir.
E mais, dinheiro público na contratação de funcionário não paga percentual para os políticos, como ocorre com as prestações de serviços por concessionárias e terceirizadas. Mas tenho certeza de que não seja isso que move a sede do PSDB e de muitos políticos por privatizações e terceirizações.
Por isso, acho que o projeto do PSDB para o Brasil hoje, é anacrônico. Não nos interessa.