O Editorial do Jornal O GLOBO de hoje, 23 de outubro de 2010, intitulado “Na Europa, a hora é de pagar a conta”, traz uma informação que classifico como em sua grandessíssima maior parte errada e uma única “lição moral” de fundo aproveitável: Estado de bem-estar social tem custo e isso deve ser monitorado para ser sustentável (esse monitoramento inclui alterações eventuais de tempos em tempos, como a que está sendo feita na França, p.ex.). Isso é a parte mínima aproveitável. Mas o texto não se destina a expressar isso, que é óbvio.
O texto apresentado, em síntese, diz ou dá a entender que a manutenção do welfare state europeu resultou ou foi mantido através de déficits orçamentários gigantescos dos países europeus e que por isso, agora, em virtude desta irresponsabilidade, a conta teria de ser paga pelos mesmos e seus cidadãos. E diz ao fim, a título de alerta, que o que ocorreu lá com irresponsabilidade fiscal também se aplica ou pode acontecer no “hemisfério sul”, ou seja, no Brasil. Evidentemente, para qualquer um, chamando a atenção para o que teima em chamar de “aparelhamento do Estado”, “gigantismo estatal” e “gastança pública”, que repetem mil vezes e não dizem onde, em que setor, em quais carreiras ocorrem todas essas “irresponsabilidades” do nosso Governo Federal, que apresenta, ao contrário, constante decréscimo de relação dívida/pib e superávit orçamentário, mesmo que diminuído após a crise financeira de 2008.
A verdade senhores é que somente se confirma, artigo após artigo, o desprendimento deste renomado canal de mídia com o interesse do Estado Brasileiro e da sociedade brasileira. Rico não precisa de serviço público. Quem precisa é pobre e classe média. O serviço público necessário de rico é o mínimo possível e é isso a que quer diminuir o Estado. Mas isso não garante qualidade de vida à massa da população, nem retorno de serviço público ao cidadão pelo imposto pago ao Estado.
O problema não foi a existência do welfare state europeu, mas da desregulação de mercado de crédito que gerou a crise de 2008 e obrigou aos Estados Europeus a bancarem o prejuízo investindo em bancos, salvando instituições financeiras, instituições de previdência, instituições de financiamento imobiliário, em cifras trilhonárias (em dólares) E ISTO SIM AUMENTOU O DEFICIT DOS PAÍSES EUROPEUS E ESTÁ COLOCANDO EM RISCO O WELFARE STATE.
A desregulamentação do mercado de crédito gerou uma crise financeira cujas dimensões perigam colocar em xeque e em risco os benefícios do resultado de uma construção de rede de bem-estar social que demorou décadas a ser produzido. É muito importante não cair na falácia deste tipo de artigo descomprometido com a verdade real e que somente adota vetor argumentativo que protege seus interesses corporativos (diminuir o Estado e os tributos que paga aos Estado brasileiro) ao invés de buscar a realidade dos fatos que deve informar a seus leitores.
E pior, ao final dando recado como se o Brasil precisasse conter seus investimentos públicos porque a Europa está endividada. O que todo país civilizado deve fazer é investir em bem-estar social na medida de suas capacidades e de forma sustentável. Quanto mais bem-estar social, o que normalmente se traduz em melhores prestações de serviços públicos em todas as áreas essenciais (segurança, logística estrutural, transporte, energia, educação e saúde), melhor para a qualidade de vida da população. O acesso a esses serviços e bens deve ser feito com responsabilidade e de forma que possa ser sustentado no tempo. E nós começamos a construir isso agora.
Tem ocorrido muito investimento público para re-estruturar quadros de funcionários públicos de várias carreiras e isso significa melhora de prestação de serviço público para toda a população. Foram construídas 214 escolas técnicas, 04 universidades federais, hospitais. Foram contratados funcionários públicos para estes estabelecimentos (metade de toda a contratação de 8 anos do Governo Lula foi para a área da educação). Foram reajustados valores remuneratórios de forma a estimular que os servidores públicos fiquem em suas carreiras e se dediquem exclusivamente a elas. Tudo isso é bom.
O alerta do editorial que critico faria sentido se os investimentos públicos feitos degenerassem as contas públicas, mas o Brasil está com uma das menores relações dívida/pib de sua história recente e uma das menores do mundo, além de superávit orçamentário de 1,5%, enquanto o mesmo editorial informa os déficits orçamentários de 10%, 13% e 15% de países Europeus como Inglaterra, Grécia e outros. Não dá pra comparar.
Não adianta o País ter bons números econômicos somente para nós e o exterior batermos palmas… isso tem que se traduzir em melhora de prestação de serviço público, melhora e crescimento de investimentos públicos (porque nós precisamos), para que tudo isso se traduza em melhora de qualidade de vida para o brasileiro, não é mesmo?
Por fim repito: NÃO FOI O WELFARE STATE EUROPEU QUE LEVOU A DÉFICITS ORÇAMENTÁRIOS E QUE AGORA LEVA A SOCIEDADE EUROPÉIA A TER DE APERTAR O CINTO. FOI A DESREGULAMENTAÇÃO DO MERCADO DE CRÉDITO EM GERAL E IMOBILIÁRIO EM ESPECIALQUE GEROU A MAIOR CRISE FINANCERIA DA HISTÓRIA DESDE 1929, A QUAL OBRIGOU OS ESTADOS EUROPEUS A RESGATAREM SUAS INSTIUIÇÕES FINANCEIRAS, VIA AUMENTO DE DÍVIDA PÚBLICA E PARA EQUALIZAR TUDO ISSO AGORA A SOCIEDADE EUROPÉIA TEM QUE PAGAR. OU SEJA, A DESREGULAMENTAÇÃO DE MERCADO FINANCEIRO PÔS, EM DOIS ANOS, EM RISCO TODA A REDE DE BEM-ESTAR SOCIAL EUROPÉIA QUE FOI ORGANIZADA EM DÉCADAS.