Aplico aqui, primeiramente, a regra que Warren Buffet aplicou aos Estados Unidos em meio ao furacão da crise financeira de 2008/2010. Enquanto todo o mercado, à medida em que a crise recrudescia, vendia ações e comprava títulos da dívida americanos, Warren Buffet informava que retirava suas posições que ainda estavam em renda fixa e estava “100% em ações americanas” (claro que das companhias que ele analisou por anos e que, agora, apresentavam-se baratas).
Por conta desta afirmação no mínimo ousada, e até inacreditável para o momento, um entrevistador pediu explicações e o investidor multibilionário respondeu: “o movimento é de baixa forte, mas já baixou bastante e este é o único mundo que existe. Se houvesse outro mundo, com certeza eu transferiria os valores daqui para lá durante esta turbulênia, mas como não há, é neste em que devemos investir. O mundo não vai acabar. Em algum momento o mercado vai voltar a subir e eu quero ser o primeiro da fila.” (citação livre)
Gente, Portugal é, dos piores mercados da Europa, o melhor. Sua dívida é alta, mas muitíssimo atrás de várias outras. A Europa já separou 440 bilhões de euros para ajudar os países em dificuldade, fora os valores que já foram aplicados na Grécia e Irlanda. Na verdade há previsão de que estes valores europeus disponíveis cheguem a 750 bilhões de euros. Já se admite como normal uma ajuda de 85 bilhões de euros, segundo presidente do BCE. E ainda há disponibilidade do FMI. Portugal não acabará e nem a Europa.
Portanto, de centenas de bilhões de dólares que temos em títulos da dívida americana que pagam 0,25% ao ano, podemos deslocar algo para Portugal e aumentar nosso retorno ao mesmo tempo em que ajudamos um país amigo.
País amigo, pois, por mais que tenhamos conflitos, é o único país do mundo com quem temos várias leis, tratados e acordos de tratamento diferenciado entre nossos cidadãos. Você pode ser servidor público em Portugal e os portugueses podem sê-lo aqui.
É muito importante não se diminuir o impacto de renovação e fortalecimento dos laços entre Brasil e Portugal que adviriam dessa posição de adoção de postura de investir em Portugal hoje, quando eles precisam. E não são poucas as vantagens.
Primeiramente, temos 300 bilhões de dólares em reservas internacionais. Somos o quarto maior credor dos EUA, somente atrás de China, Japão e Inglaterra, nesta ordem. Investir 10 bilhões de dólares em títulos portugueses representa, em caso improvável de calote, 0,33% de nosso patrimônio. Mas seria evidente resposta diplomática aos investimentos que os portugueses fizeram aqui (via investimentos privados) na época em que nossa economia estava debilitada entre 1994 e 1998, como por exemplo investimentos de redes hoteleiras e do Banco Espírito Santo (também investiram via Portugal Telecom). Foi bom quando precisamos e uma oportunidade de investimento para eles. Convém sermos recíprocos.
Além disso, temos de perceber que o mundo é um clube e encontrar amigos não é fácil. Nosso amigos naturais são somente três no mundo: vizinhos latino-americanos, especialmente da América do Sul, Portugal e países africanos lusófanos. Não há comparação para a aproximação possível entre países que possuem laços históricos, culturais, institucionais, econômicos e linguísticos. E para o Brasil, estas carcterísticas somente estão presentes nestas hipóteses. São onze vizinhos sul-americanos e oito países lusófanos. 19 países mais próximos em mais de 200 no mundo.
Os EUA e a Inglaterra possuem laços estreitíssimos com os países anglófanos, em especial integrantes da Comunidade Britânica de Nações e isto dá enorme vantagem geopolítico-estratégico e geoeconômico-estratégico em nível mundial.
É claro que antes, endividados, não podíamos fazer muito por nossos poucos amigos, mas Portugal investiu milhares de escudos e depois euros em nossas bibliotecas e universidades, assim como em instituições similares africanas. Eu fui no I Seminário Luso-Brasileiro de Estudantes de Direito em Lisboa e Coimbra, em 1996, e além de atendimento e atenção primorosa, chegamos a ser recebidos pelo próprio Presidente português Jorge Sampaio. Ao saberem que a UFRJ tinha necessidade de recursos, pelo menos a faculdade de direito (recebíamos 20% do orçamento previsto no período do Governo FHC), ofereceram livros a serem transferidos, mesmo que com uma perplexidade momentânea, porque estavam se dedicando aos africanos e não imaginavam essa necessidade no Brasil.
Agora, senhores, é a nossa vez. Cuidemos dos que nos são mais próximos, porque boa vontade não tem preço, e amigos ou nações com identidade histórico-cultural não sobram no mundo em que nós estamos. Além disso, ao meu ver, é excelente negócio, desde que em valores consideráveis para eles e baixos para nossa disponibilidade, pois o retorno é muito maior do que os dos títulos da dívida americana.
Dilma está fazendo corretissimamente: invistamos em Portugal agora, pois, após a turbulência, teremos perdido tanto a oportunidade de reciprocidade e demonstração de boa-vontade como a oportunidade de obter juros maiores pelo mesmo dinheiro que hoje está em grande parte em títulos americanos de remuneraçao menor, com segurança não tão maior assim.
p.s.: é claro que os títulos americanos são mais seguros, mas pelo tamanho da economia americana e pela influência americana no mundo e por ser o dólar moeda de troca de grande parte de todas as transações mundiais. Mas tecnicamente, a dívida americana é maior do que a portuguesa e não tem previsão de diminuir a necessidade de financiamento externo do déficit gêmeo. Isto tem uma configuração menor em Portugal, cuja economia também é muito menor. A inflação americana foi de 1,45% em 2010, isso significa que quem investiu em títulos da dívida americana remunerada a 0,25%, amargou prejuízo de 1,20%. Neste sentido a alegação de risco americano em relação ao português.
p.s. 2: confira os índices de inflação mundiais de 2010 no endereço http://pt.global-rates.com/estatisticas-economicas/inflacao/2010.aspx