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Conflitos de interesses – Grande mídia x Sociedade x Serviço público

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Senhores e senhoras, a grande mídia tem notável importância na nossa sociedade, não há a menor dúvida. Sua importância é tanto maior na medida em que proporciona um debate profundo sobre os temas que aborda, dando oportunidade de o leitor conhecer a matéria veiculada e garantindo sua possibilidade de ponderar por si só sobre a questão. Isso é tanto mais possível quanto mais isenta é a mídia. Mas isso é muito difícil, pois a empresa jornalística é primeiramente uma empresa, e ela precisa tanto pagar impostos como vender notícia. O interesse, portanto, em fazer dinheiro com a venda de notícia é uma grande pressão para que a abordagem dos textos seja atraente ao público alvo tanto quanto não conflite com seus interesses de empresa jornalística, óbvio.

Acho muito importante notar uma grande parcialidade na abordagem de temas destinados ao público, em especial em matéria de orçamento, impostos, estatais e serviço público. E o meu objetivo é tentar fazer um contraponto desta visão empresarial jornalística a bem de se tentar aproximar um pouco mais da verdade, a qual não pertence a ninguém, mas que pode ser alcançada tanto mais perspectivas sobre ela possam ser apresentadas à sua Excelência, o Leitor.

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Agora, se nós leitores somente temos acesso ao que é publicado pela grande mídia, como fugir da parcialidade da notícia veiculada? Este é um objetivo deste blog. Trazer contrapontos sobre a notícia veiculada para que você tenha acesso a duas informações e por final, e muito mais importante, conclua por si mesmo qual é a verdade e qual é o seu real interesse em dado tema, pois ser conduzido por uma massa de informação em sentido único não é o melhor para você, nem para sua família, nem para o Estado, nem para a Sociedade.

O que aplicarei aqui para a análise deriva do conceito passado a nós por Miguel Reale em seu livro “Filosofia do Direito”: é a ontognoseologia ou o estudo do objeto, enquanto ente cognoscível e do sujeito que conhece, enquanto ser cognoscente. Ou seja, o objeto sobre o que se discute deve ser estudado como objeto puro, sem paixões ou condicionalidades que induzam ou limitam seu conhecimento sobre ele. E aquele que apresenta um argumento ou explica o objeto de estudo deve ser analisado como sujeito com características próprias, com condicionalidades que induzem ou limitam o seu conhecimento sobre o objeto em discussão.

Imagine três homens da Idade Média: um árabe, um europeu cristão e um chinês. Um árabe falará das cruzadas realizadas pelos cristãos da idade média de uma forma diferente da que um cristão ocidental falaria, porque a perspectiva do árabe e do cristão são diferentes sobre o mesmo fato. Ouvir apenas um desses discursos sem estar atento para o que caracteriza cada um desses senhores, no caso de você ser um chinês que não sofreu a influência das cruzadas em sua história, não o ajudará a entender corretamente sobre o que verdadeiramente foram as cruzadas, para o bem ou para o mal.

Portanto, para você entender o máximo do tema em debate, deve analisar o tema e quem o apresenta a você, da forma o máximo possível imparcial e fria, sabendo que é impossível a quem escreve não se submeter a suas próprias crenças e, nesta medida, alterar a verdade daquilo que quer apresentar. Por isso você deve criticar, ter senso crítico, para não ser conduzido pela perspectiva alheia, seja de uma pessoa (caso em que me incluo e aos jornalistas), seja de uma empresa jornalística, seja de um grupo social em particular. Você não deve desprezar nenhuma perspectiva, mas se quiser entender a verdade sobre o fato, deverá estar atento a todas elas, entendendo seus interesses envolvidos, para poder ponderar o que é importante para você, o que está em jogo para o seu interesse e assim, melhor se conduzir de forma autônoma. Acredite-me, isto não é fácil, mas o mais importante é você não admitir ser conduzido por ninguém e estar disposto a ouvir e ler sobre perspectivas diversas com o fim de não se deixar ludibriar pela primeira perspectiva lógica que se lhe é oferecida.

É importante, por fim, que você entenda que o argumento apresentar-se como lógico não garante que seja correto ou verdadeiro. Isso é uma das mais célebres regras para o desenvolvimento do raciocínio autônomo, por mais óbvio que possa parecer. A lógica seduz nosso raciocínio e, se bem conduzida, transforma preto em branco, quadrado em redondo e assim ficamos preso em sua armadilha. Um dos livros mais interessantes que me apresentaram esse conceito foi “O Homem que calculava” de Malba Tahan, pseudônimo de Júlio César de Mello e Souza, além de o livro “O que é dialética”, de Leandro Konder, se não me engano, da Editora Brasiliense, Coleção Primeiros Passos. É conhecido o aforismo de que “a lógica é a prostituta das ciências”, pois ela se presta a defender qualquer coisa e um resultado de fácil percepção foi o apelo que o Nazismo obteve em seu País, a Alemanha de 1932.

Sendo assim, podemos perguntar, como pode neste momento, em que o Brasil é um dos países com melhores condições orçamentárias, crescimento do PIB, com um dos menores déficits orçamentários de todo o mundo e uma das melhores relações dívida/PIB, em relação mesmo aos países mais ricos, e com uma da menores (se não a menor) relações número de servidores públicos/número de habitantes de todos os países da OCDE, a grande mídia noticiar inchaço da máquina estatal, gastança descontrolada, contratação irresponsável e concessão de aumentos nababescos e desnecessários a todo o funcionalismo público?

Bem, primeiramente o termo inchaço senhores, pode ser logicamente compreendido quando há aumento de número de servidores. Isso tem apelo. É claro que ninguém quer gasto público desnecessário. Ninguém quer pagar mais impostos e servidores são pagos com impostos. Mas todos precisam e querem boa prestação de serviço público, o que só pode ser fornecido por número suficiente de funcionários e em qualidade compatível com a complexidade do cargo que exercerá.

Veja: a Polícia Federal do Brasil tinha, em 2002, 7.500 funcionários. Hoje tem 21 mil, mais ou menos. Inchou a máquina pública? Uma análise somente dos números de funcionários pode indicar que sim, mas em 2002 na Argentina havia 30 mil policiais federais. Este país tem metade do território brasileiro e tinha 1/6 da nossa população, à época. Pergunto agora: inchou-se o quadro de funcionários da Polícia Federal brasileira? Não, recuperaram-se os quadros da Polícia Federal dando um mínimo de estrutura humana para exercer a função de segurança pública, resultando em melhora sensível e diria a olhos vistos pela imensa quantidade de prisões efetuadas, inquéritos e investigações em andamento e concluídos, como muito bem noticiado pela mídia. Quem saiu beneficiado com esse investimento público em recursos humanos? Você, cidadão honesto e todas as empresas honestas deste País. Porque, não se engane, a única coisa que você tem de volta pelo imposto que paga é serviço público, que, por sua vez, é prestado por servidores públicos. Investir no serviço público é garantir o retorno do seu imposto pago. Para o seu bem e da sua família. Investir no serviço público é investir no seu interesse por uma melhor prestação de serviço público seja de segurança pública, saúde pública, pesquisa espacial, pesquisa agrícola, distribuição de justiça, defesa nacional, educação pública, diplomacia e relações internacionais.

Observe agora o caso de médicos do Estado do Rio de Janeiro. Apesar da complexidade de suas funções, eles recebem em torno de R$1.300,00. Um professor estadual então, nem se fala. Com esses valores e sem investir em melhora estrutural você nem consegue que os candidatos a médico e professor tomem posse em seus cargos ou aqueles que estão nesses cargos estão abandonando ou terminam por ter de se dedicar a outros serviços para complementar o salário. E qual é o resultado para você? Menos servidores e servidores desmotivados, ou seja, pior prestação de serviço público.

Hoje, senhores e senhoras, temos esvaziamento de quadros públicos e a maneira de você garantir melhora na prestação de serviço público é contratando e aumentado salário, seja para manter os que estão em seus cargos, seja para aumentar seu comprometimento (porque ninguém trabalha em dois ou três empregos, prejudicando sua qualidade de vida, porque quer), seja para atrair novos e capazes funcionários públicos para garantirem o retorno do seu imposto. Veja as causas da má prestação do serviço público geral hoje. Você que pesquisar verá baixos salários e poucos e desmotivados funcionários.

E para os funcionários que já ganham acima da média? Do Judiciário por exemplo. Muito simples, senhores, novamente de forma crítica, você deve ponderar o que eu quero como servidor para exercer esta função? Qual o nível do meu servidor do Judiciário (praticamente todos os técnicos têm nível superior e uns 40% de analistas e técnicos têm pós-graduação, inclusive mestrado ou doutorado)? Quais as opções que este servidor tem em outros cargos públicos (são 14 outras carreiras públicas que pagam até 80% a mais, a propósito)? Eu quero manter um bom funcionário ou quero economizar na remuneração? Se eu economizar qual é o benefício? Se eu investir, qual é o benefício. Não importa a sua resposta. Se você fez a pergunta de forma correta, descobriu os benefícios e malefícios de sua opção, a opção está correta. A conseqüência do que você decidiu pode não ser a melhor para você, mas você optou conscientemente. (È claro que você não sabe, nem os jornais publicarão, que o orçamento do Judiciário é de 6% o Orçamento da União, enquanto que o orçamento do Executivo é de 90% o orçamento da união e que aumento do Judiciário ou criação de novas Varas, dentro do limite de 6% do orçamento do Judiciário, não impede programas de governo nem aumentos a aposentados ou do salário mínimo, porque a origem de verbas é diferente e autônoma por causa do princípio da separação de poderes da República)

Pergunto: a Polícia Federal teve bom aumento salarial de 2002 para cá (ainda pode ser notada alguma defasagem com outros quadros da carreira pública) e uma grande contratação. Isto foi bom ou ruim? Manter políticas de valorização do funcionário público e recuperar quadros da carreira pública que não tinham funcionários suficientes é bom ou ruim para garantir o retorno do seu imposto? Não pense em fulano ou cicrano que está no cargo, mas na política de manutenção ou reforço do cargo público e do quadro da carreira pública para prestar serviço público com eficiência para você, hoje e no futuro próximo. O servidor se aposenta ou falece, o cargo e o quadro público é para sempre e servirá a você e a seus netos.

E o interesse da empresa jornalística? Senhores, a empresa jornalística é uma empresa. Ela quer pagar tanto imposto como eu ou você, só que pode publicar a sua opinião. E a opinião tem que ter apelo popular. Explicar a realidade é chato, mas sensacionalismo com malversação de dinheiro público é interessante. Eu gostaria que sem dinheiro o Estado pudesse prestar serviço público, mas o imposto de renda na Suécia é de 65% e no Japão próximo disso. Você vê sueco e japonês reclamando do imposto de renda? Não. Porque eles têm serviço público de qualidade e sentem-se retribuídos pelo Estado. O problema não é o imposto é o serviço público que você tem pelo que você paga.

Aqui temos um servidor para cada 32 habitantes. Segundo o Jornal O Globo, em publicação no dia 08 de junho de 2010, na França há 1 servidor público para cada 12,5 habitantes e há 1 servidor para cada 18 habitantes na Alemanha. Quem está com melhor serviço público? Será que o número de servidores por habitante tem correlação com isto?

Vejo outra coisa, serviço público não publica propaganda em jornal, mas empresas que prestam serviços terceirizados sim. Acabar com o serviço público pode até ser lucro mais a frente com o incremento da publicidade e crescimento da terceirização.

Preste atenção ao seu interesse e ao de quem lhe passa notícia. Analise as informações, analise o interesse de quem lhe vende a notícia e quer que você compre, mais do que quer que você entenda a questão. Até porque, na confusão, quem tem a notícia reina e enriquece.

Abusos devem ser noticiado e coibidos, mas se não pudermos recuperar o serviço público agora em que temos crescimento econômico, déficit orçamentário mínimo (1,5% negativo ao ano, enquanto os EUA apresentam 10% negativo, Inglaterra 12% negativo e Alemanha e França também ao menos 4 vezes pior do que nós), quando poderemos garantir serviço público de qualidade suficiente para a nossa demanda atual e futura?

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